domingo, 5 de janeiro de 2014

Os limites da amizade

Cinema com diálogos. É disso que eu gosto. Pessoas se expressando, identificação através de palavras, de gestos, de olhares. Não apenas clichês e efeitos especiais que tornam tudo mais lúdico e, por isso mesmo, menos realista. A vida é feita dos diálogos, tantos os que falamos, quanto os que deixamos de falar. E quando o cinema nos traz uma obra que retrata realisticamente e naturalmente o que acontece conosco, ela ganha um ponto extra comigo.

O cinema mumblecore trouxe essa proposta: produzir filmes que tenham em seus diálogos a força necessária para transmitir através da obra o que acontece na vida. Porque na vida não temos sempre a resposta pronta, nem temos a soluções rápidas para nossos problemas. E, na maioria das vezes, ninguém vai nos salvar de nada. A vida simplesmente acontece. O que é, afinal, esse movimento? O mumblecore, “geração do resmungo”, em inglês, é o nome dessa onda do cinema norte-americano de filmes independentes. É um movimento artístico que ganhou força após o 11 de setembro. É um cinema autoral, que tem nos diálogos a sua principal força. São pessoas comuns, passando por problemas que todos passamos. Flexibilidade nos roteiros, improviso, utilização de captura digital de imagens e o fator confessional das histórias contadas na tela são as marcas do movimento.

E nem preciso dizer que sou fã do movimento, né? E que filmes como Frances Ha e séries como Girls fazem parte dele e, por isso, figuram na lista dos meus favoritos. Bem, toda essa divagação faz parte da introdução de um filme de um diretor muito importante do movimento, Joe Swanberge que me tocou muito: Drinking Buddies

O filme tem a história centrada em Kate (Olivia Wilde) e Luke (Jake Johnson), dois amigos funcionários de uma fábrica de cerveja. Com gostos parecidos, os dois sempre flertaram um com o outro, mas nunca entraram em um relacionamento, porque Luke está pensando em se casar com sua namorada, e Kate namora um produtor musical. Como diz o título, eles, além de amigos, são "parceiros de copo", passam os dias a beber, jogar sinuca, beber de novo... Os dois são claramente perfeitos um para o outro, embora sejam comprometidos. O filme mostra justamente até onde essa "linha" da amizade entre homens e mulheres, pode ser ultrapassada. 



É aí que o cinema autoral mostra todo o seu diferencial. O filme aponta de forma crua o que de fato acontece nesses relacionamentos. Pontos para o diretor, que deixou os atores à vontade para improvisar suas cenas. Inclusive, o filme não tinha um roteiro com falas definidas. Swanberg dava os "esqueletos" das cenas para os atores e falava para eles as desenvolverem a partir daquilo. Além desse fator, soma-se a química perfeita entre Wilde e Johnson. A improvisação deu mais que certo, como é provado numa cena de conversa entre entre Kate e Luke. Ela fala o seguinte: "That's the problem with heartbreak, is that to you it's like an atomic bomb and to the world it's just really cliche, because in the end we all have the same experience". Sensacional! 


quinta-feira, 2 de janeiro de 2014

A obrigação de crescer e amadurecer


Como gosto de ressaltar aqui frequentemente, me admira cada vez mais a capacidade do cinema de despertar a identificação através de uma obra. Posso afirmar que é através dessa identificação que encontramos a catarse necessária para enfrentar e lidar com a realidade. Pelo menos, é o que acontece comigo. 

É com essa introdução que venho apresentar Frances Ha, um dos melhores filmes que vi este ano. Muitas foram as comparações que vi, nas críticas que li, com a série Girls, de Lena Dunham. No entanto, apesar de eu ser completamente apaixonada pela série de Dunham, como já mostrei aqui e aqui, "Frances" desponta como uma obra menos crua esteticamente e, embora mais doce, é também triste e melancólica.   

Vamos à história: Frances (Greta Gerwig) divide um apartamento em Nova York com Sophie (Mickey Sumner), sua melhor amiga. Brincalhona e com ar de quem não deseja crescer, ela recusa o convite do namorado para que more com ele justamente para não deixar Sophie sozinha. Entretanto, a amiga não toma a mesma atitude quando surge a oportunidade de se mudar para um apartamento melhor localizado, mesmo que isto signifique que ela e Frances passem a morar em locais diferentes. A partir de então tem início a peregrinação de Frances em busca de um novo lugar que se adeque às suas finanças, já que ela é apenas aluna em uma companhia de dança à espera de uma chance de integrar o grupo de bailarinos que encenará o espetáculo de Natal. Mesmo diante das dificuldades, Frances tenta manter o alto astral diante os problemas que a vida adulta traz.

Achamos que ao sair da faculdade caminharemos rumo ao crescimento pessoal e profissional rapidamente. Mas as coisas não são assim e é nesse período que muitos de nós somo obrigados a crescer e amadurecer, por mais que muitas vezes relutemos. O mais impressionante é nos darmos conta de que, além de não estarmos onde e como imaginávamos, também vermos que os nossos sonhos estão bem longe virarem realidade.

E é sobre isso o filme dirigido por Noah Baumbach. A obra traz uma leveza, ao mesmo tempo em que é um "wake up call" para essa geração, a minha geração. Todos nós crescemos, mas não necessariamente amadurecemos. Mais uma vez ressalto a importância da arte, pois é através dela que enxergamos de forma mais ampla o que ocorre em nossa volta. Espero que não aconteça apenas comigo. 



OBS: Não posso deixar de citar duas cenas que, na minha opinião, foram as melhores do filme: a cena de Frances dançando ao som de Modern Love, de David Bowie e uma linda cena de uma conversa em um jantar. Maravilhosas!