domingo, 2 de outubro de 2011

"You always hurt the one you love"



A cena que pode ser considerada mais marcante e triste do longa “Namorados para sempre”, é quando a personagem de Michelle Williams diz com todas as letras para Ryan Gosling que não sente mais nada por ele. A intensidade da atuação da dupla é tão forte que traz um realismo marcante para o filme. A cena citada é apenas um aperitivo do percurso do filme.
Não se engane com o título infantil que foi pessimamente “traduzido”. Blue Valentine, nome original do longa,  é um drama melancólico que narra a deterioração de um relacionamento. Para trazer mais realismo ao filme, o diretor Derek Cianfrance filmou primeiro as cenas do casal se apaixonando, para depois rodar as do fim do casamento, onde eles chegaram a um nível insuportável de convivência.
Williams e Gosling são um dos melhores atores dessa geração. Intensos, bonitos e cheios de atitude e nuances visíveis em suas performances, a dupla é o grande destaque de “Namorados para sempre”. A belíssima trilha sonora conta com "You always hurt the one you love", justamente na cena em que o personagem de Gosling canta para a amada. A música não poderia ser mais condizente com o filme. A direção consistente, somada a um roteiro muito bem escrito fazem desse filme um dos mais tristes e sensacionais dos últimos anos. 


quarta-feira, 6 de julho de 2011

Escapismo nostálgico


Muitas vezes o vazio de nossas vidas é preenchido por alguma forma de entretenimento, ou na ilusão de felicidade plena em uma época diferente. Woody Allen é representante confesso dessa premissa. O escapismo já foi retratado pelo cineasta em "A Rosa Púrpura do Cairo" e volta agora em grande forma com o delicioso, soberbo e naturalmente triste "Meia Noite em Paris".   
O filme é um deleite! Me faltam palavras pra descrever a sensação que tive ao assisti-lo. É  impressionante a identificação que eu tenho com Allen. Com o diretor e seus personagens principais, sempre espelhados em sua própria personalidade. 
Allen veio dessa vez coberto de nostalgia, aquela impressão que temos de não pertencer à nossa época. O diretor sempre deixou clara essa nostalgia através de suas entrevistas, principalmente as recentes para promover o longa.      
Dessa vez seu alter-ego foi interpretado maravilhosamente (sim, eu também me surpreendi!) por Owen Wilson! Woody Allen é tão maravilhoso (não me canso de babar por ele!) que conseguiu tirar uma performance sutil e graciosa de Wilson. Os trejeitos, a leve gagueira, o jeito de andar, as piadas que ninguém entende, tudo transmite Allen. Tenho a audácia de citá-lo como o melhor alter-ego desde o próprio diretor!
No filme, Owen Wilson é Gil, um roteirista de relativo sucesso em Hollywood e que sempre idolatrou os grandes escritores americanos. Frustrado com a profissão e sonhando escrever um grande romance, ele está prestes a ir a Paris ao lado de sua noiva, Inez (Rachel McAdams), e dos pais dela, John (Kurt Fuller) e Helen (Mimi Kennedy). John irá à cidade para fechar um grande negócio e não se preocupa nem um pouco em esconder sua desaprovação pelo futuro genro. Estar em Paris faz com que Gil volte a se questionar sobre os rumos de sua vida, desencadeando o velho sonho de se tornar um escritor reconhecido.
Em uma noite, cansado dos programas e futilidades de sua noiva e do amigo dela, um pseudo-intelectual (Michael Sheen), Gil sai pela cidade. Quando é meia noite, ele é magicamente transportado para a Paris dos anos 1920. É ali que encontra todos seus ídolos. Zelda e Scott Fitzgerald, Cole Porter, Pablo Picasso, Ernest Hemingway, Salvador Dalí, um jovem Luis Buñuel, entre outros. É lá também que conhece a musa de Picasso, Adriana (Marion Cotillard) a qual se encanta perdidamente.       
A partir daí, ele começa a "voltar ao passado" todas as noites. Com o pretexto de estar trabalhando em seu livro, Gil se livra dos programas com Inez, que nada tem a ver com ele e parece não acreditar de fato em seu talento.
É realmente difícil explicitar o brilhantismo do longa. Além de uma trilha sonora deliciosa, incluindo o próprio Cole Porter em uma de suas aparições no passado (com direito a deliciosa canção "Let's do it"), a atmosfera é toda saudosista. 
No entanto, Gil vê que todo aquele idealismo é, de fato, um idealismo! Diferente da vida real, é uma fantasia. O personagem descobre que, assim como ele, algumas pessoas daquela época também não estavam satisfeitas em seu tempo. Não é nada mais que escapismo e não importa a ocasião, é tudo uma questão de nosso interior.


domingo, 12 de junho de 2011

Desconstruindo "A Origem"



Complexo, o mundo dos sonhos é um tema que já foi abordado em Hollywood, embora não tão minuciosamente como nesse filme de Christopher Nolan. A origem e a inserção de uma ideia são as questões retratadas no filme. Tais temas são tão curiosos para a sociedade, que geram admiradores e estudiosos sobre eles. Freud é pioneiro quando o assunto é desvendar o conteúdo dos sonhos. Afinal, como a mente do ser humano é capaz de criar um mundo paralelo enquanto dormimos? Por que os sonhos parecem tão reais e palpáveis quando estamos nele? Como se diferencia o que é real e o que não é? Inteligente, criativo e, por que não, inovador – embora a visível semelhança com outros filmes de ficção científica, como Matrix – A Origem é a real mistura de entretenimento com um roteiro inteligente, capaz de tirar o fôlego do telespectador.
A trama, onde não é explicitada a época, trata de um mundo onde é possível entrar na mente humana. Cobb (Leonardo DiCaprio) está entre os melhores na arte de roubar segredos valiosos do inconsciente, durante o estado de sono. Além disto, ele é um fugitivo, pois está impedido de retornar aos Estados Unidos devido à morte de Mal (Marion Cotillard), sua esposa. Desesperado para rever seus filhos, Cobb aceita a ousada missão proposta por Saito (Ken Watanabe), um empresário japonês: entrar na mente de Richard Fischer (Cillian Murphy), o herdeiro de um império econômico, e plantar a ideia de desmembrá-lo. Para realizar este feito ele conta com a ajuda do parceiro Arthur (Joseph Gordon-Levitt), a inexperiente arquiteta de sonhos Ariadne (Ellen Page) e Eames (Tom Hardy), que consegue se disfarçar de forma precisa no mundo dos sonhos.


Para entrar nesse mundo, existem vários “macetes”. É necessário que as pessoas sejam sedadas, de um arquiteto para criar o mundo onírico, dos ladrões para armarem a trama e de uma pessoa capaz de se transformar de acordo com a personalidade da vítima. Cobb tem a principal função de conduzir o sonho, e roubar ou inserir uma ideia.
O que é fascinante no longa, é o fato do roteirista – também Nolan – ter buscado aspectos existentes dos sonhos e ter encaixado na história. Uma cena que exemplifica isso é quando Cobb está explicando a Ariadne como funciona todo esse esquema. Em certo ponto da conversa, ele indaga: “Como você chegou aqui?”. Ela para, pensa e então responde: “Não sei”. É então que Ariadne descobre estar em um sonho. Tal ponto ressalta o fato de nunca lembrarmos quando chegamos nele. Simplesmente estamos lá. Uma sacada bastante eficiente do diretor e roteirista. Outro aspecto de nossos sonhos mostrado na película é o fato de que só acordamos de um sonho quando morremos. Isso é visto incansavelmente em A Origem.

Percebe-se que Cristopher Nolan fez uma pesquisa voraz no assunto. O roteiro demorou aproximadamente 10 anos para ser finalizado. O cineasta, que se consagrou na franquia de Batman, é um dos jovens e celebrados diretores dessa geração. Seus filmes conseguem misturar entretenimento de massa, sem que descartar uma trama inteligente e complexa, onde não há precisamente um final definitivo.
Geralmente, em filmes de entretenimento, os personagens são na maioria das vezes caricatos e sem profundidade emocional. Embora o filme não explore tanto as outras figuras, Cobb é um personagem digno de curiosidade. Perturbado pelo suicídio de sua esposa, que aparentemente enlouqueceu, o ladrão de sonhos vive em um impasse onde não consegue se livrar das memórias referentes à morte de Mal. Na maioria dos sonhos em que ele “trabalha”, Mal está presente. E essa presença o distrai de sua função. Como é o caso de uma das primeiras cenas do longa, onde ela o atrapalha na missão de roubar uma ideia de Saito.     
O que a presença constante de Mal significa? Na verdade, não é ela propriamente, e sim sua projeção do inconsciente de Cobb. O limbo em que viveram anos atrás é retratado no início e no fim da trama. Um pergunta intrigante é: e se Cobb nunca saiu de lá? Mal simplesmente enlouqueceu, ou realmente estava certa quando se matou, para sair do sonho em que ela acreditava estar? E no final do filme, quando vemos o objeto girando sem parar. Aquilo tudo foi um sonho? O que é real? A que realidade pertencemos? Será possível estarmos vivendo em um mundo onde é tudo imaginação? Como se pode constatar, A Origem veio para explorar e tentar entender o universo onírico e quem sabe, vermos que nada é tão real quanto parece. Ou é? Essa incógnita é o que há de mais atraente no filme. O final indefinido nos leva a diversas visões sobre o tema.


quarta-feira, 8 de junho de 2011

Um futuro não muito distante


Como uma faminta em cultura cinematográfica e amante de filmes das décadas passadas, vocês não imaginam a satisfação que tive quando vi o clássico Farenheit 451  (1966) de François Truffaut , um dos fundadores do movimento Nouvelle Vague. Esse foi o único filme em inglês do cineasta.
O longa é uma ficção científica, o que para mim é pouco para classificá-lo. Filosofia, relações humanas, cultura, literatura e repressão social. São esses os temas retratados nele. Assisti Farenheit 451 em uma aula da faculdade, em uma eletiva que faço de cinema e, desde então, me apaixonei.
Para resumir, a película é a adaptação do romance homônimo de Ray Bradbury  e se passa em um Estado totalitário num futuro próximo, onde os "bombeiros" têm como função principal queimar qualquer tipo de material impresso, pois foi convencionado que literatura um propagador da infelicidade. Mas Montag (Oskar Werner), um bombeiro, começa a questionar tal linha de raciocínio quando vê uma mulher preferir ser queimada com sua vasta biblioteca ao invés de permanecer viva. 
No caminho de casa, Montag conhece uma mulher (Julie Christie) que o aborda e diz que o observa há certo tempo. Na conversa deles, ela indaga: "Você lê os livros antes de queimá-los?". A pergunta o deixa intrigado. Por outro lado, sua esposa, Linda é o retrato da sociedade da ficção. Vivida também pela ótima Julia Christie, ela é alienada, só assiste aos programas de TV manipuladores e vive à base de remédios. Diferentemente, Montag não vive dessa forma e no fundo é um questionador. 
Conforme a amizade com a moça do trem cresce, ele vai contestando cada vez mais sua função. E para saciar sua curiosidade, passa a pegar alguns livros antes de queimá-los e se apaixona pela literatura, desconhecida pela maior parte da população. 
O desenrolar do longa é muito bom e o final é fascinante e inspirador. Vou me limitar até essa parte, pois vale muito a pena assisti-lo. Eu me surpreendi positivamente, pois não sou a maior admiradora de ficção científica.
Portanto, fica a dica. Aluguem! É um daqueles filmes que ficam na memória e mostram como o cinema pode mudar nossa forma de ver a sociedade e a vida. Afinal, o futuro do filme não é tão distante do nosso.  
OBS: O título é referente à temperatura que os livros são queimados. Uma sacada genial do autor!

domingo, 5 de junho de 2011

"Please, let me get what I want this time..."


Como é bom encontrar uma comédia romântica diferente. É clichê dizer que a indústria cinematográfica repete as mesmas histórias o tempo todo, mas essa é a verdade. No entanto, pelo menos uma vez a cada dois ou três anos vemos algo fora do usual. E é esse o caso de "500 Dias com Ela". É até limitado classificar o filme como comédia romântica, pois vemos drama e até uma cena digna de musical. São esses elementos que fazem o filme tão bom e atípico.


Partindo do princípio "garoto conhece garota" e com cenas de flashbacks, a linha narrativa é tão surpreendente quanto o desenvolvimento de sua história. Tom (Joseph Gordon-Levitt), um azarado escritor de cartões comemorativos e romântico sem esperanças, fica sem rumo depois de levar um fora da namorada Summer (Zooey Deschanel), ele volta a vários momentos dos 500 dias que passaram juntos para tentar entender o que deu errado. Suas reflexões acabam levando-o a redescobrir suas verdadeiras paixões na vida.
A história nos encanta primeiramente devido aos personagens principais e seus intérpretes. Tom é adorável, sensível e completamente apaixonado por Summer. Summer é liberal, de espírito livre, mas nunca foi apaixonada por Tom, embora gostasse muito dele. Em comum, eles têm o gosto musical. E por falar em música, a trilha sonora do filme é impecável. Virei fã de The Smiths devido ao longa.
Joseph e Zooey têm uma ótima química em tela. Quase não reconheci o nerd de "10 Coisas que Eu Odeio em Você". A semelhança com Heaht Ledger é nítida. Zooey se mostra tranquila em sua personagem e além de linda e boa atriz, ela é cantora da excelente banda folk She & Him, em parceria com M. Ward.
 Voltando ao filme, vemos a inversão de papeis das típicas comédias românticas. Normalmente, são as mulheres que sofrem por não serem correspondidas. Não é esse o caso. Aqui, o pobre Tom que tem seu coração partido. Por mais insensível que Summer pareça, o carisma de Zooey Deschanel tira qualquer resquício de antipatia da personagem.
No final, cheguei a uma conclusão. A vida é feita de fases, e por pior que elas sejam o ideal é tentarmos tirar proveito delas de alguma forma. E o que eu vi foi que a relação de Tom com Summer foi uma fase. Aventureira, turbulenta, incerta. Como os verões devem ser. E quem sabe, com a chegada do outono, as coisas se acalmem.

domingo, 15 de maio de 2011

Splendor in the grass



O filme de hoje é de um diretor muito polêmico em sua época, o ótimo Elia Kazan. "Clamor ao sexo" é um longa da década de 1960, mais precisamente de 1961. A trama se passa no final dos anos 1920, e conta a história de Bud (Warren Beatty) e Deanie (Natalie Wood), um casal de estudantes, no estado do Kansas. Apesar da grande paixão do casal, o romance sofre forte resistência pela repressão sexual da sociedade da época.

A sinopse conta brevemente sobre um tema que até na década de 1960 era mal visto no cinema: a repressão sexual. Deanie, uma garota de família humilde, foi criada pela mãe, de maneira que o sexo era apenas uma forma de reprodução. Bud, de família rica, ama Deanie, mas luta contra suas vontades e quer algo mais do que apenas os beijos a que eles se limitam.
Vale ressaltar a irmã de Bud, uma jovem à frente de seu tempo, que namorava bastante, bebia muito e não se adequava às regras da sociedade da época.
Desejando se casar com Deanie (ambos estavam no último ano da escola), Bud propõe a ideia ao pai, que resiste. Ele quer que Bud vá para Yale e, após os quatro anos de curso, volte e se case com ela. A moça decide esperar pelo namorado, mas nem tudo caminha conforme o planejado.
Sem controle sobre seus impulsos reprimidos, Bud decide terminar com Deanie para, como seu pai aconselha, procurar uma moça mais fácil que o satisfaça rapidamente.
E é justamente isso que ocorre. O resultado é péssimo, pois Deanie se desequilibra emocionalmente, entrando em estado de depressão profunda.
Sobre a história, me limito até esse ponto. Muitas situações acontecem depois e o filme se desenvolve brilhantemente. Vale a pena se surpreender com os fatos ao decorrer da película.
Após o ótimo e também polêmico "Uma Rua chamada Pecado", Kazan repete sua crítica à hipocrisia da sociedade, que resulta em filmes de qualidade. O desempenho de seus atores é sempre muito bom. E aqui quem sobressai é Natalie Wood. O filme é dela, que inclusive recebeu uma indicação ao Oscar na categoria de melhor atriz. Todas as nuances de sua personagem são bem trabalhadas. Além dela, Warren Beatty, em seu primeiro filme, surpreende com sua atuação realista para um novato no cinema.
É de enorme satisfação ver um filme feito há 50 anos e que, mesmo assim, permanece atual. O longa recebeu o Oscar de melhor roteiro original.
Para fechar, cito o que é para mim a melhor cena do filme. É o momento em que Deanie explica na sala de aula o poema de William Wordsworth, que um de seus trechos dá título ao filme: Splendor in the grass:

"What though the radiance which was once so bright
Be now for ever taken from my sight,
Though nothing can bring back the hour
Of splendor in the grass, of glory in the flower;
We will grieve not, rather find
Strength in what remains behind..."

terça-feira, 3 de maio de 2011

Insatisfação crônica



Eu amo Woody Allen. Não tem jeito. Tudo que ele produz eu quero ver. Desde filmes mais leves como "Escorpião de Jade", até os mais tensos, no estilo tragédia grega como "Match Point". Mas hoje vou comentar sobre o meu preferido: "Vicky Cristina Barcelona". Que filme! Fotografia belíssima, histórias nos moldes loucos de Allen, personagens fáceis de se identificar e atuações memoráveis. E claro, seu alter ego. No caso, Vicky, interpretada muito bem por Rebecca Hall. No elenco destacam-se também Javier Bardem, super charmoso como Juan Antonio, Scarlett Johansson que também se mostra à vontade como a insatisfeita e impulsiva Cristina e Penelope Cruz. Nem é necessário dizer que é ela quem rouba a cena. Complicada, neurótica, maluca. Essa é Maria Elena. 

Penelope ofusca todos a partir do momento em que entra em cena. Eu, que comecei a gostar de suas performances quando vi "Volver", concluí o quanto ela é talentosa. Parece que Woody Allen tem esse poder de extrair o melhor de seus atores. Não sei se pela direção "desleixada", os deixando improvisar, ou pelo simples fato de ele ser brilhante. O fato é que quase todos os atores querem trabalhar em seus filmes.

Na história, Vicky e Cristina são amigas que vão passar as férias de verão em Barcelona. Vicky está noiva e é sensata nas questões do amor. Cristina é pura emoção. Durante uma exposição de arte, as duas se encantam pelo pintor Juan Antonio, que as convida mais tarde, durante um jantar, para uma viagem. O que elas não sabiam é que ele mantém um relacionamento problemático com sua ex-esposa Maria Elena. E as coisas ainda ficam piores porque as duas, cada uma de sua forma, se interessam por ele, dando início a um complicado "quadrado" amoroso. 

O cinema característico de Allen está fortemente presente. Pessoas neuróticas e indecisas, questões existencialistas e certezas estilhaçadas. Ninguém está satisfeito e nem próximo disso. Como a vida, nada é imutável. Com seu humor sarcástico e refinado, o diretor retrata tudo isso. Sendo uma comédia, faz parecer mais leve. No entanto, como no final do filme, você pode sair do cinema ainda mais confuso do que quando entrou. Mas nada como uma confusão no estilo Woody Allen, não é?

terça-feira, 26 de abril de 2011

The Killer's Song

Após alguns anos sem dirigir filmes, Tarantino faz seu retorno triunfal com esse grande sucesso de público e crítica. Novamente trabalhando com sua musa Uma Thurman, esta mistura de gêneros é o primeiro dos dois filmes que contam a história da protagonista “A Noiva”. A Noiva (Uma Thurman) é uma perigosa assassina, que trabalha em um grupo liderado por Bill (David Carradine) e que é composto principalmente por mulheres. Ela está prestes a se casar, mas no dia de seu casamento, Bill e suas companheiras de trabalho se voltam contra ela, quase a matando. Ela fica 5 anos em coma, até despertar com um único desejo: vingança.
Partindo de uma perspectiva não linear, o filme narra historia de “A Noiva” que busca vingança pelo massacre no dia de seu casamento, que resultou em seu coma.
Logo na primeira cena, vemos “A Noiva” chegando a uma casa para matar uma mulher. Até então não sabemos nada de sua história. No frenético segmento há uma briga entre as duas, cheia de sangue e violência à moda Tarantino. Nada de "briga de mulherzinha" com puxões de cabelo. É tudo profissional.
A partir de então o filme vai acontecendo em uma sequência de flashbacks e idas ao futuro, deixando o espectador intrigado quanto à história. A busca da protagonista é matar as pessoas do grupo assassino liderado por Bill (que era seu amante) e do qual ela fazia parte. Como ela abandonou o grupo, Bill decidiu vingar sua fuga através desse massacre.
Em referência aos filmes de samurai, o longa ao mesmo tempo em que satiriza, é uma homenagem ao gênero. As cenas coreografadas perfeitamente são um deleite para o público que gosta de filmes cheios de socos e sangue, chegando a ser cômicas, devido ao seu grande grau de violência. Outro ponto alto do filme é sua trilha sonora. A música traz toda tensão transformando as cenas em pura catarse. É o caso da famosa sequência em que a personagem de Darryl Hannah caminha calmamente pelo corredor do hospital para matar “A Noiva” ao som de “The Killer’s Song”. A cena resulta numa mistura de sensualidade e fatalidade. A personagem é a típica femme fatalle.
Destaca-se também a atuação da ótima Uma Thurman. O filme que foi roteirizado baseado na personagem criada por Tarantino e pela atriz, se encaixa perfeitamente em sua carreira. Depois do sucesso da parceria com Thurman em “Pulp Fiction”, é nesse filme que a relação do diretor com sua musa é consagrada.

terça-feira, 12 de abril de 2011

"You cannot find peace by avoiding life"





Filmes pessoais são os que mais me atraem. Acho que a profundidade dos personagens desse gênero faz eles se aproximarem de nós, pessoas reais. Quando falo isso para os outros, recebo instantaneamente reações de espanto. Dizem: "Esse filme é deprimente! Como você pode gostar disso?". Mas é exatamente o oposto. Acho que o cineasta quer justamente nos alertar através do problema de seus personagens. O artista quer mostrar "Olha, isso está errado, vamos mudar!". Por isso, esses filmes têm efeito catártico em mim.  
Essa introdução foi feita para explicar o filme que comento hoje. "As Horas", baseado no livro homônimo de Michael Cunningham, é um dos filmes mais poéticos que já assisti. Sem dúvida, está entre meus preferidos. Para que não conhece, o longa retrata, em três períodos diferentes, a vida de três mulheres ligadas ao livro "Mrs. Dalloway", de Virginia Woolf, incluindo a própria. Em 1923 vive Virginia Woolf (Nicole Kidman), autora do livro, que enfrenta uma crise de depressão e ideias de suicídio. Em 1950 vive Laura Brown (Julianne Moore), uma dona de casa grávida que mora em Los Angeles, planeja uma festa de aniversário para o marido e não consegue parar de ler o livro. Nos dias atuais vive Clarissa Vaughn (Meryl Streep), uma editora de livros que vive em Nova York e dá uma festa para Richard (Ed Harris), escritor que fora seu amante no passado e hoje está com Aids e morrendo.
A partir de então, as histórias são interligadas, retratando semelhanças e diferenças entre elas. O livro de Woolf é um importante pano de fundo, quase um personagem do filme. Em 1923, a autora escreve o livro, em 1950 Laura Brown lê o livro e anos 2000, Clarisse Vaughn é a própria Mrs. Dalloway.  
Não quero estragar o prazer de quem tem a intenção de ver o filme, por isso não vou me aprofundar no que ocorre durante ele. Mas posso dizer que não é um filme só para mulheres. Ele retrata a depressão, a insatisfação de estar preso em uma vida que não se quer. De esconder o que realmente sente. Esses sentimentos são universais. Não a depressão em si, mas a insatisfação, principalmente em um mundo em que, às vezes, nos encontramos presos. 
A doença vista frequentemente como fator positivo no processo criativo, é vista de outra maneira aqui. Virginia que se sente infeliz e depressiva, não consegue realizar seu trabalho muito bem, apesar de ter começado o livro. Algumas pesquisas mostram que sua fase mais criativa foi justamente quando estava com a saúde melhor. 
Tanto as atuações, quanto a direção e o roteiro do filme são impecáveis. Acredito que Nicole Kidman (maravilhosa) ganhou o Oscar de melhor atriz pelo seu desempenho na cena da estação de trem. Na ocasião, toda angústia da personagem é exposta e sua brilhante atuação é comovente. Quando ela diz "até o pior paciente tem direto de opinar sobre seu próprio remédio", está fantástica.
Agora, para mim, o maior destaque no filme é Julianne Moore. Ela é uma das melhores atrizes do cinema atualmente. Me espanto como ela perdeu a estatueta na época para Catherine Zeta-Jones em "Chicago". Vemos quando um ator é realmente completo quando ele consegue traduzir toda sua emoção através do olhar e em poucas palavras. E é exatamente isso que ela faz.  
Meryl Streep dispensa comentários, apesar de não ser o maior destaque do filme e Ed Harris está em seu melhor papel. 
Por fim, um filme belíssimo que nos faz pensar se estamos realmente apreciando nossa vida e fazendo boas escolhas. Como diz Virginia para seu marido na já citada cena da estação de trem, "You cannot find peace by avoiding life", traduzindo, "Não se pode ter paz evitando a vida".

domingo, 3 de abril de 2011

"Here's looking at you, kid"


Hoje vou escrever sobre um dos meus filmes favoritos: Casablanca (1942), um dos maiores clássicos de todos os tempos. No contexto da Segunda Guerra Mundial, o filme narra uma história de amor, com mistério e drama, que encanta gerações e permanece atual. Bogie e Bergman formam um dos casais mais charmosos do cinema. Pode-se dizer que todos os clichês românticos que vemos atualmente no cinema vieram de Casablanca. As frases são tão memoráveis que viraram jargões. "Here's looking at you, kid", "We'll always have Paris", " Play it once, Sam. For old times' sake", entre tantas outras...
A sinopse: Rick (Humprey Bogart) é dono de um famoso bar localizado em Casablanca, no Marrocos Francês, durante a Segunda Guerra Mundial. A cidade é rota de fuga para quem deseja evitar os nazistas, onde passes livres são vendidos por um salgado preço no mercado negro. Neste caótico ambiente, Rick encontra Ilsa (Ingrid Bergman), com quem tivera um amor interrompido inesperadamente há algum tempo, em Paris.
 O charme de Bogie, de Bergman, do figurino e da inesquecível  canção "As Times Goes By", consolidam o filme na história do cinema. Outra marca do longa é o patriotismo exacerbado, retratando bem o período.
A atuação teatral de Bogie, que fazia parte da forma de interpretação da época é realmente fascinante. Considero Bogart um dos pontos altos do filme. E Ingrid Bergman também empresta sua doçura, necessária para a personagem.
Foi vencedor dos Oscars de melhor filme, direção e roteiro e ainda indicado a melhor ator para Humprey Bogart, coadjuvante para Claude Rains, fotografia, trilha sonora (Comédia/Musical) e edição.
Muito bem recomendado!

domingo, 27 de março de 2011

A família que todos nós temos...




Meu post de estreia será em homenagem à maravilhosa e, agora saudosa, Elizabeth Taylor. Sou amante de filmes antigos e tudo o que remete às décadas passadas, época de ouro do cinema. 
Com sua morte, o canal TCM passou este sábado uma série de filmes da diva e eu, que adoro clássicos, vi pela primeira vez Gata em Teto de Zinco Quente.Baseado na obra do grande dramaturgo Tennessee Williams, o filme é um drama que fala sobre relações familiares. 
E como eu já imaginava, o longa é sensacional! Os diálogos e as atuações são seus pontos fortes. Paul Newman, além de lindo, dá um show como o orgulhoso e amargurado Brick Pollitt, um ex-famoso jogador de futebol americano.
Antes da análise, a sinopse. Brick (Paul Newman), um ex-famoso jogador de futebol americano, agora alcoólico pela vergonha, nega sua bela esposa (Elizabeth Taylor), a quem culpa, por causa de um incidente com seu amigo de campo Skipper, de ter abandonado sua carreira profissional. Brick também não quer saber de seu pai Harvey – ou “Big Daddy”, como todos o chamam, interpretado por Burl Ives -, que está morrendo de câncer, pois ambos nunca tiveram um diálogo aberto e são demasiado orgulhosos para se tornarem amigos nessa altura da vida. Porém, no dia do aniversário de Harvey toda a família está reunida, incluindo seu irmão advogado, e nesse dia segredos serão desenterrados e verdades serão ditas entre todos os presentes à festa.
As interpretações de todo o elenco estão ótimas. Mas os destaques vão para Liz Taylor, Paul Newman e Burl Ives. Provavelmente devido à intensa carga dramática de seus personagens. Mas é claro, não vamos tirar os créditos desse excelente trio. A química entre os intérpretes de pai e filho é ótima e a cena que eles finalmente deixam o orgulho de lado para uma franca conversa é maravilhosa. Liz também mostra que além de linda, foi uma atriz de primeiro escalão e sua intensidade é comovente. Burl também nos encanta como o patriarca que ignora sua grave doença. Realmente fantástico! 
Uma curiosidade é que a sinopse do filme teve de ser alterada por causa do teor homossexual, que na década de 1950 era censurado. Na peça teatral, insinua-se que Brick ficou amargurado porque amava seu melhor amigo. Já no filme, apesar de esnobar sua esposa, Brick ainda a ama, mas é muito orgulhoso para demonstrar. Provavelmente foi por causa dessa alteração que Tennessee Williams, que era homossexual, desacreditou no sucesso do filme.
Deixando as polêmicas de lado, mesmo com uma alteração desse nível, o filme se sustenta até o final e a história é revelada conforme seu andamento. As situações familiares são tão verossímeis que é possível se identificar com essa família. Afinal, conflitos familiares são universais.
Enfim, um clássico que merece ser visto e revisto. Para quem ama cinema, é obrigatório!