Muitas vezes o vazio de nossas vidas
é preenchido por alguma forma de entretenimento, ou na ilusão de felicidade
plena em uma época diferente. Woody Allen é representante confesso dessa
premissa. O escapismo já foi retratado pelo cineasta em "A Rosa Púrpura do Cairo" e
volta agora em grande forma com o delicioso, soberbo e naturalmente triste
"Meia Noite em Paris".
O filme é um deleite! Me faltam
palavras pra descrever a sensação que tive ao assisti-lo. É
impressionante a identificação que eu tenho com Allen. Com o diretor e
seus personagens principais, sempre espelhados em sua própria
personalidade.
Allen veio dessa vez coberto de
nostalgia, aquela impressão que temos de não pertencer à nossa época. O diretor
sempre deixou clara essa nostalgia através de suas entrevistas, principalmente
as recentes para promover o longa.
Dessa vez seu alter-ego foi
interpretado maravilhosamente (sim, eu também me surpreendi!) por Owen Wilson! Woody Allen é tão
maravilhoso (não me canso de babar por ele!) que conseguiu tirar uma
performance sutil e graciosa de Wilson. Os trejeitos, a leve gagueira, o jeito
de andar, as piadas que ninguém entende, tudo transmite Allen. Tenho a audácia
de citá-lo como o melhor alter-ego desde o próprio diretor!
No filme, Owen Wilson é Gil, um roteirista de relativo
sucesso em Hollywood e que sempre idolatrou os grandes escritores americanos.
Frustrado com a profissão e sonhando escrever um grande romance, ele está
prestes a ir a Paris ao lado de sua noiva, Inez (Rachel McAdams), e dos pais
dela, John (Kurt Fuller) e Helen (Mimi Kennedy). John irá à cidade para fechar
um grande negócio e não se preocupa nem um pouco em esconder sua desaprovação
pelo futuro genro. Estar em Paris faz com que Gil volte a se questionar sobre
os rumos de sua vida, desencadeando o velho sonho de se tornar um escritor
reconhecido.
Em uma noite, cansado dos
programas e futilidades de sua noiva e do amigo dela, um pseudo-intelectual (Michael Sheen), Gil sai pela
cidade. Quando é meia noite, ele é magicamente transportado para a Paris dos
anos 1920. É ali que encontra todos seus ídolos. Zelda e Scott Fitzgerald, Cole
Porter, Pablo Picasso, Ernest Hemingway, Salvador Dalí, um jovem Luis Buñuel,
entre outros. É lá também que conhece a musa de Picasso, Adriana (Marion Cotillard) a qual se
encanta perdidamente.
A partir daí, ele começa a
"voltar ao passado" todas as noites. Com o pretexto de estar trabalhando
em seu livro, Gil se livra dos programas com Inez, que nada tem a ver com ele e
parece não acreditar de fato em seu talento.
É realmente difícil explicitar o
brilhantismo do longa. Além de uma trilha sonora deliciosa, incluindo o próprio
Cole Porter em uma de suas aparições no passado (com direito a deliciosa canção
"Let's do it"),
a atmosfera é toda saudosista.
No entanto, Gil vê que todo
aquele idealismo é, de fato, um idealismo! Diferente da vida real, é uma
fantasia. O personagem descobre que, assim como ele, algumas pessoas daquela
época também não estavam satisfeitas em seu tempo. Não é nada mais que
escapismo e não importa a ocasião, é tudo uma questão de nosso interior.